19 de set. de 2014

Edição 29 - Os desafios do estudo da Bíblia



Quem convive diariamente com sua Bíblia nem sempre se dá conta de que ela foi escrita há milhares de anos. Sem o perceber faz uma leitura seletiva dela, acolhendo o que entende e do que gosta, mas deixando de lado o que desagrada ou parece complicado. No entanto, ler a Bíblia assim não ajuda a amadurecer na fé em Jesus. E, maturidade é indispensável para enfrentar os desafios que cercam o povo de Deus nos dias de hoje. A seguir quero delinear três aspectos elementares que ajudam no estudo sério e consciencioso das Sagradas Escrituras:

1) Imagine a Bíblia como uma enorme pintura que retrata mais de um milênio da história de Deus com seu povo. Para compreender seus detalhes é preciso que, primeiro, tenhamos uma visão desta pintura toda. Precisamos entender o que une os 66 livros da Bíblia: a) Todos eles descrevem que o ser humano não corresponde ao propósito para o qual fora criado. Pelo contrário, mostram como ele vive em rebeldia constante contra seu Criador. b) A Bíblia também testemunha que Deus se curva com paciência sem igual sobre as suas criaturas rebeldes a fim de resgatá-las para ter comunhão com elas. Estas duas afirmações perpassam toda Bíblia até se cruzarem no Calvário: na morte e ressurreição de Jesus o amor de Deus alcança definitivamente a humanidade atolada no pecado e a resgata para a nova vida como filhos e filhas de Deus. Sem captar e acolher este panorama geral os mistérios da palavra de Deus jamais nos serão revelados.

2) Quem tem clareza e certeza deste panorama geral tira grande proveito em prestar atenção a detalhes do retrato que a Escritura faz. Pois, os profetas e apóstolos escreveram para pessoas de carne e osso que viviam numa época e em ambientes muito diferentes dos nossos. Fizeram-no na linguagem e usaram comparações que conheciam. Nas parábolas, por exemplo, Jesus recorreu ao cotidiano de criadores de ovelhas, agricultores e pescadores da Galileia. Assim, o olhar cuidadoso para o passado faz parte do nosso esforço de captar o que os autores queriam dizer aos primeiros ouvintes e leitores. Isto inclui o estudo das línguas nas quais a Bíblia foi escrita, a geografia, a cultura e a história dos tempos bíblicos. O Manual Bíblico da Sociedade Bíblica do Brasil reúne num livro acessível para qualquer leitor as principais informações garimpadas por estudiosos.

3) Mas saber detalhes sobre o contexto original da Bíblia ainda não nos dá compreensão do que ela tem a dizer a nós que vivemos dois mil anos depois numa sociedade urbana globalizada. Por isto é necessária uma terceira abordagem que identifica o que equivale em nossa cultura àquilo que a Bíblia ensina. Enquanto, por exemplo, não detectarmos que nosso coração é uma fábrica de desejos tão ambiciosos como o coração do povo de Babel, jamais compreenderemos como os nossos anseios, secretos ou declarados, destroem relacionamentos e comunhão. Ou, se vemos nos fariseus meros inimigos de Jesus, aquilo que o Mestre lhes disse jamais nos afetará. Quem, porém, percebe nas atitudes deles as dos “crentes” de hoje, descobrirá que nosso coração sabe cultivar a mesma vaidade piedosa. Lutero e Calvino não hesitaram em fazer estas atualizações ao expor a Bíblia, mas a grande maioria dos comentaristas modernos não se atreve a dar este terceiro passo. Por isto ajudam tão pouco as igrejas no seu testemunho concreto.

Encerro esta breve reflexão com a recomendação de um livro muito precioso: Timothy Keller: A CRUZ DO REI (Vida Nova/São Paulo. 2012). É um livro de leitura agradável e simples que guia o leitor pelo evangelho de Marcos. De modo singelo este pastor de Nova Iorque conecta cada passagem com o cenário bíblico maior; elucida aspectos importantes do contexto de então e atualiza a palavra para o ouvinte moderno. Além de fazer-nos atentar para o surpreendente testemunho do evangelista, também nos exercita nos passos de estudo bíblico acima descritos. Que o Espírito Santo nos dirija em nosso aprendizado. Amém.

Martin Weingaertner, diretor da FATEV 
 weingaertner.martin@gmail.com

1 de set. de 2014

Edição 28: Um Conceito Original de Ser Família

A compreensão estreita que vê a religião apenas como aquela que diz o “que pode” e “o que não pode” interfere na maneira como compreendemos a vontade de Deus também a respeito da família. A Bíblia não é um manual de instruções. Ela contém princípios que nos revelam a boa, agradável e perfeita vontade de Deus. E, o Apóstolo Paulo diz que esta é uma vontade que podemos experimentar. Mas, isso depende de certo inconformismo com o “espírito da época” (Rm 12.2). A vontade de Deus a respeito da família está revelada já no princípio das Escrituras. Lemos em Gênesis 1.27 que “criou Deus o homem à sua imagem, à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou”. Diferente daquilo que costumamos ouvir, o Novo Testamento não revela coisas diferentes, anulando a revelação do AT. A vontade de Deus permanece a mesma. Jesus deixa isso muito claro quando, numa discussão com os fariseus, faz uso daquilo que todos já sabiam: "Vocês não leram que, no princípio, o Criador ‘os fez homem e mulher’ e disse: ‘Por essa razão, o homem deixará pai e mãe e se unirá à sua mulher, e os dois se tornarão uma só carne’?” (Mateus 19.4-5).

Jesus não apresenta nenhuma reinterpretação para acomodar o texto e a vontade de Deus aos “novos tempos”. Ele apenas reafirma a revelação e a vontade original de Deus. Pois é isto que Cristo veio fazer: restaurar o mundo e o ser humano que encontram-se corrompidos pelo pecado. Jamais veremos Jesus justificando o pecado ou propondo uma releitura da Bíblia de modo que se encaixe melhor em nossos padrões.

As distorções, consequências do pecado, obviamente estão aí, por toda parte. Mas, Jesus não autorizou que nenhuma destas distorções fosse colocada como referência legítima para novos modelos. Ele sempre de novo apontou para o Pai, o Criador, a origem de tudo. Aquele cuja vontade é boa, perfeita e agradável! Viver segundo esta vontade é viver conforme a realidade que o Pai desejou!

O Senhor Jesus é aquele que redime também relacionamentos, lares, e famílias! Que possamos nos deixar transformar por sua graça e misericórdia, de modo que experimentemos a boa, agradável e perfeita vontade de Deus para nossas famílias!